
COTIDIANO
Todo dia nós fazemos tudo igual e postamos várias horas da manhã. A necessidade da atual geração é estar sempre exposta, numa espécie de competição por popularidade. A entrega aos meios virtuais permite a falsa idéia de sermos quistos pelos demais. Buscamos o maior número de amigos ou seguidores. Construímos blogs e gastamos vastas horas do nosso cotidiano para a alimentação dos personagens que interpretamos na tela.
Nunca foi tão fácil inflarmos nosso ego social e nos apresentarmos como quer que seja. Cabe à nossa seletiva escolha de palavras nas descrições dos perfis afora, para atingirmos os leitores exatamente como esperado. O apelo visual das ferramentas e utensílios disponíveis, como fotos e vídeos, reforça a construção desta personalidade a ser assimilada pelo nosso círculo social.
Stanislavski discorre em seu livro “A Construção do Personagem” sobre os diversos artifícios que o ator deve recorrer para a formulação perfeita do papel a ser interpretado. Mal sabia que em tempos de redes sem-fio e da geração SMS, suas técnicas seriam naturalmente aplicadas por qualquer um que intente ingressar no amplo mundo dos internautas. Arriscar posição contrária pode ser visto como suicídio social.
Mesmo diante das adversidades recorrentes, sejam quais forem e independente da intensidade, recusamos todas as atitudes analógicas. O bullying ocorre via mensagens de texto entre celulares, as fofocas recheiam as páginas pessoais, vidas são destruídas por vídeos caseiros e vizinhos tornam-se célebres no You Tube. Os nerds se passam por descolados. As gordinhas estão em forma. O aluno rebelde tem página para suas especulações desprovidas de argumento e ainda sim, registra números impressionantes de comentários em cada texto. Namoros iniciam via email e terminam pelo MSN. Mallu Magalhães, coitada, acredita que as visitas no My Space façam dela cantora.
A tragédia maior recai na máscara que vestimos. Distanciamo-nos gradativamente de nossa sombra (viva Jung!) e a cada scrap estamos cada vez mais longe de quem verdadeiramente somos. Fernando Pessoa nos alertou anos atrás, que determinada hora, a máscara estará grudada ao nosso rosto (persona). Conseguimos nos convencer de tudo que adoraríamos ser e passamos a viver em locais públicos. Os danos serão irreparáveis. Pouco importa. A liberdade de escolha diante de um número infinito de personagens é apelativa e estamos seduzidos. Gil cantou sobre a internet quando esta dava os primeiros passos e soava musical. As trilhas são inúmeras. E estão todas ilegalmente disponíveis no E-mule e no Limewire aguardando download.
Irônico pensar na vastidão do mundo da internet e no que poderia nos propiciar, quando nos submetemos e passamos a teclar cada letra passivamente. Escravos de nossos perfis, depoimentos e buddypokes.
Tomara que as músicas continuem sendo baixadas, os blogs escritos e os perfis criados. Mas que os internautas se tornem mais conscientes e possam desempenhar seus papéis com a verdade que lhes condiz. Bons tempos aqueles em que o amor era o ridículo da vida. O amor é virtual. Assim como o sexo, as amizades e tudo aquilo que você não é.
Palavras pouco românticas para os orkuteiros e twitteiros de plantão, escritos por um blogueiro, membro da mesma rede que une todos nós. Sou lido e visto. E você que não é? Deve estar morto.
Texto por DIEGO PONCE DE LEON