quinta-feira, 29 de maio de 2008

"1968 - O Ano Que Não Terminou", de Zuenir Ventura


1968 – o ano que mal começou

Passei o reveillon daquele ano em Paris. No que me compete, não poderia afirmar que na capital francesa tenha ocorrido festa similar à celebração do ano que surgia, como a que se deu na casa de Heloisa Buarque de Holanda. Zuenir Ventura abre “1968 – O ano que não terminou” (Planeta, 2008) relatando os casos e acasos daquela memorável noite, que de alguma forma, como pretende o autor, já estabelecia o tom dos acontecimentos que estava por suceder e varrer o país de uma forma avassaladora.

A história me elegeu testemunha quando permitiu que eu estivesse a caminho do Cinematéque, onde pretendia assistir qualquer filme, embora já soubesse que possivelmente Godard estaria em cartaz, no dia mais importante de sua trajetória, quando sucumbiu e fechou as portas. Ali se anunciara tempos antes, que “Terra em Transe”, de Glauber Rocha, faria parte uma mostra de filmes latinos a ser montada. Eu soube do culto ao filme de Glauber no Brasil e aguardava ansiosamente por sua estréia. Não demorou para que eu fosse informado pelos dispersos estudantes que circulavam nas proximidades, do absurdo que significava o afastamento de Langlois. Quando percebi, já era militante ativo de uma manifestação que ocorria em frente ao cinema. Nesse instante, ajudei a pichar “É proibido proibir”.

Foi o sociólogo e intelectual Fernando Henrique Cardoso, por acaso meu professor na Universidade de Nanterre, que me proporcionou um panorama crítico e detalhado dos eventos que abalavam a sociedade brasileira. De tais eventos, testemunha eu não fora, mas Zuenir me fez observador atento.

Leandro Konder, filósofo da época e personagem na obra de Zuenir, foi quem melhor definiu as atribuições do livro quando afirma: “1968 – O ano que não terminou presta relevante serviço à revitalização da consciência democrática brasileira.” Num país de memória escassa e que ao desconhecer o passado, se condena a repeti-lo, Zuenir Ventura esmiúça o passado e nos condena a engoli-lo. Vítima da repressão que se instalava, Zuenir se mostra imparcial e retrata fielmente os ocorridos. Mas recorre, sem pudor e com maestria, à ironia clara, que seria referência em seus textos futuros. Célebres ou inusitados, os momentos descritos ganham formas impecavelmente vívidas e vorazes, onde os coadjuvantes são protagonistas e os detalhes, texto principal.

A morte de Edson Luís de Lima Souto, no Rio, nem se compara à agitação ocasionada em virtude de sua missa de sétimo dia. Morto irrisoriamente durante tumulto causado pelo descontentamento do aumento nos preços do restaurante estudantil Calabouço, descobre-se que foi sua missa, não sua morte e muito menos ainda sua militância (inexistente), que o fez mártir da juventude. Diante da Candelária, eu certamente teria repetido: “Inesquecível, padres.”

A Passeata dos Cem Mil é, literalmente, um capítulo à parte. Podemos transitar dentre a multidão e por alguns instantes o livro em nossas mãos quase se torna mais um cartaz dentre tantos. A rua ao lado poderia ser a Rio Branco ou a Presidente Vargas. O Teatro Municipal se ergue majestosamente nos tropeços da imaginação. Escutamos com uma clareza estarrecedora as palavras dos vários discursos de Vladimir Palmeira. Zuenir sabe a medida exata da longitude de seu texto. Pouco mais, era capaz de me levantar e esbravejar meus ideais. Ao término do capítulo, eu disse em voz alta, como se diante de uma platéia: “Foi o espetáculo mais impressionante que eu vi na minha vida”.

Por vezes, a sensação é repugnante. O estômago embrulha. Como assistir um filme de David Linch. Indigerível. A veracidade cinematográfica da assembléia no Teatro de Arena da Faculdade de Economia, na Praia Vermelha, que culminou com a vingança abusiva, imoral e subversiva no campo do Botafogo é incômoda. A sexta-feira sangrenta pungiu minha dignidade e manchou de vermelho minha impotência. Naquele dia, eu já teria atestado: “Quando o Exército não será um valhacouto de torturadores?”. A única cor rouge que pairava minhas afixações, era a representada por Daniel Coehn.

Caetano, Gil e Geraldo Vandré protagonizavam o ménage à trois mais interessante do cenário musical relevante. Com direito a amante de luxo: Chico Buarque. O painel musical e as transformações culturais oriundas desse, trazem ritmo e uma dinâmica melodiosa ao livro. As letras, as peças de teatro, o idealismo artístico, a nudez de Marília Pêra, a boca suja de Marieta Severo, o carcará de Bethânia, a alegria de Veloso, o domingo de Gil, as carolas de Chico e por fim, as flores de Vandré, expunham o liberalismo e a evolução do senso comum. Talvez maior herança daquele ano. Empurraram os estudantes e deram voz às suas reivindicações.

Estudantes! Caros estudantes. Invejo-os. Não que as passeatas no Quartier Latin fossem despretensiosas. Mas a causa não era minha. Teria trocado a ocupação da Sorbonne, pela da UNB. Preferia o gás lacrimogêneo. Os papéis picados do centro. As reuniões clandestinas. As sessões extraordinárias de “Roda Viva”. Justo, serem vocês o fio condutor, a linha de argumentação de Zuenir Ventura. Mas admito, no que tange o congresso da UNE em Ibiúna, ali, durante a organização eu teria sido Caetano Veloso e berraria aos quatro cantos: “ Vocês não estão entendendo nada, nada, nada, absolutamente nada!”. A perspectiva presente seria melhor se sequer existisse qualquer movimento estudantil. Deu lugar ao egoísmo acadêmico.

Jogando às favas os escrúpulos da consciência, o AI-5 foi instituído. Minuciosamente detalhado pelo autor, acompanha-se os passos de Costa e Silva no fatídico 13 de Dezembro. Pedro Aleixo tem seu legado quase heróico documentado e Jarbas Passarinho aproveita para não posar de madalena arrependida. O cenário e todos seus elementos, a iluminação, os figurinos, o elenco, a sonoplastia, o contra-regra, o preço do ingresso, os improvisos e a transparência cênica, são apresentados de forma tão assustadoramente claros, que a previsibilidade dos atos finais antes que as cortinas se fechem é soberana. Cai o pano. Quem não caiu, foi de Gaulle. Pelo menos não vi.

Quisera eu ter participado do reveillon de Helô. E lá, jamais teria dito que aquela libação significava “o fim de uma era, e não, infelizmente, começo de uma nova”. Zuenir Ventura prova o contrário. Que o diga a líder estudantil da AP, que gritava “Quero trepar! Quero Trepar!”. Dizem que ela, virgem na festa, já perdeu a conta. A fonte é segura. Essa transformação deu tempo de eu ser testemunho.

Texto por Diego Ponce de Leon

terça-feira, 13 de maio de 2008

Perdendo "la ternura"




Uma das mais tradicionais comunidades a co-existir entre nós, acordou abalada e profundamente sentida com uma notícia inesperada, cujas conseqüências ainda não tomaram as devidas proporções. Recebida de maneira festiva por uns e de forma fúnebre por outros, a pacata e amigável comunidade vê-se dividida e ansiosa pelos próximos acontecimentos. Unânime é certamente a expectativa de todos perante o anunciado discurso a ser lido, pelo líder comunitário, claramente devastado, Gargamel Guevara.
O afastamento de Fidel Castro do governo cubano trouxe uma sensação de perda e derrota talvez desconhecidas do governante de botas vermelhas. Orgulhoso por manter vivo e em perfeita harmonia, o único povoado absolutamente comunista em todo o mundo, Gargamel se enfraqueceu com a queda de uma referência ideológica como Fidel. Admirava-o em demasia e utilizava-se de seus ensinamentos para manter intacto o sentimento socialista entre os smurfs. Num já longínquo passado, fora assim que tornou todos iguais em Smurflândia. Ao estipular que cada cidadão azul se vestisse da mesma forma, trabalhasse exclusivamente em equipe e não ostentasse bens materiais, atingiu gradativamente níveis de excelência comunista até então considerados impossíveis, talvez até mesmo por Lênin ou Marx.
Gargamel, que adquiriu o sobrenome Guevara recentemente, para honrar a morte e os ideais do companheiro de outrora, recolheu-se indefinidamente, e esteve em público em duas ocasiões somente. Para anunciar o discurso que ditará as novas diretrizes da comunidade, onde deverá exprimir seu pesar pela queda de Fidel, e em rápida visita à ilha cubana , onde esteve com Raúl Castro.
Temido e rejeitado por vários, Gargamel perde forças na manutenção de seus objetivos. Se não fosse a idade avançada de 137 anos que já o aflige, a queda de Fidel traz perspectivas indesejáveis.

Num futuro breve, os smurfs talvez já usem calça jeans.


Texto por Diego Ponce de Leon

sexta-feira, 9 de maio de 2008

Sou Brasileiro

Sou brasileiro. Tenho vergonha do meu país. Assisto perplexo as notícias que tangem a inevitável corrupção praticada por nossos eleitos. Políticos empossados com nossa benção protagonizam o mais assustador filme de terror já produzido. Digno de Bela Lugosi. Maior frustração é saber que esta película não atingirá um final feliz. Não há “mocinhos” na história e nosso herói é o principal bandido.
Servidores públicos atuam magistralmente em seus papéis que consistem na ação de omissão. Contribuem silenciosos e imunes de culpa, para que o grande desfecho trágico atinja seu ápice. Será o triunfo! Condecorações deveriam ser distribuídas para estes ineptos coadjuvantes. Políticos são peças fundamentais para esse enredo e seriam descritos por Nelson Rodrigues como “cretinos fundamentais” nesse roteiro. Como os figurantes malandros de “Cidade de Deus” e os personagens hipócritas de Fellini.
Nós, o povo, assistimos calados nossa própria desgraça, regados da ilusão de não sermos parte daquilo escancarado na tela diante de nossos olhos. Pagamos o ingresso. Destarte, propiciamos a existência deste entretenimento simplório, que de forma alguma jaz efêmero. Simplório somos e esta ignorância irrisória e característica, efêmera jamais fora. No final do filme, levantar-nos-emos e sairemos da sala de projeção. Munidos da vergonha daquela banalidade explícita, nada comentaremos. Afinal, qual o sentido de discutirmos algo tão natural e cotidiano? Alguém mais corajoso poderá comentar: “triste, não?!”. Será rapidamente tomado pela decepção ao receber como réplica: “faz parte” ou “é a vida, meu filho”.
Mas todos nós esperaremos ansiosos pela seqüência e mais uma vez lotaremos a sala de projeção. Enquanto a segunda parte não chega, continuaremos a acordar às 5 da manhã, iremos abandonar nossas famílias e partir em busca do soldo nosso de cada dia que garante nossa patética existência. Afinal, não recebemos auxílios pecuniários, pelos menos não em forma de esmola. Diferentemente daqueles do filme, patrocinados por nosso suor para continuarem atuando. Ora! Eles merecem! São pessoas de valor, cultos, que sacrificaram a vida inteira para escrever o nosso destino. “Até aí, morreu Neves...”.
Viva os filmes de Frank Capra, desprovidos de sensações intelectualizadas e conteúdo pragmático, mas protagonizados por pessoas comuns, como nós. Acima de tudo, repletos de finais felizes.

“Quem me dera ao menos vez (...) acreditar que o mundo é perfeito, que todas as pessoas são felizes.”

Sou brasileiro e já desisti há muito tempo.

Texto de Diego Ponce de Leon

quinta-feira, 8 de maio de 2008

Welkomm!!!!

Faça das minhas palavras, as suas. Seja bem-vindo. O prazer é todo seu!!