O jornalista Adriano Silva, colunista de Época, reproduziu recentemente uma lista de personalidades consideradas “overrated”. O termo britânico engloba qualquer assunto ou pessoa que receba atribuição superior a real valia. Ou seja, aqueles que talvez gozem de prestígio inabalável, mas que não mais façam jus ao elogio. A idéia foi conscientemente e reconhecidamente plagiada da revista Rolling Stone, que em sua edição americana incluiu entre os “super-valorizados” a cantora standard Barbra Streisand, vencedora de Grammys e detentora de vendas exorbitantes, mas que há alguns anos não produz nada inovador e chega a desafinar. Robert de Niro e sua performance prolixa de canastrão mafioso também foram criticados. Aparentemente, diz o periódico, o ator de personagens míticos como Scarface, não mais impõe qualquer pessoalidade aos novos tipos que incorpora e se restringe a repetir caras e bocas, que são velhos conhecidos do público.
Adriano enumera suas vítimas e nos convida fazer o mesmo. Aceitei o convite.
Eis a minha lista:
Gal Costa: a cantora baiana, peça fundamental no movimento tropicalista e pilar da cultura musical brasileira, perdeu-se no repertório e se mantém num ostracismo incômodo há alguns anos. A voz aguda característica não causa o mesmo impacto e a doce bárbara vive encostada na sombra de um passado brilhante, mas já distante. A igualmente importante colega de cena, Maria Bethânia, segue caminho inverso. Munida de uma maturidade explícita e de uma escolha impecável de canções, a irmã de Caetano usufrui de um prestígio digno e justo, construído a base de Tom Jobim e Chico, mas também de Almir Sater e Lenine. As poesias de Fernando Pessoa seriam até desnecessárias, mas adoçam ainda mais o mel da abelha rainha. A outra, dizem, nem mais a letra de “Meu nome é Gal” consegue lembrar.
Pelé: o rei do futebol brasileiro deveria ter se restringido a carreira esportiva. Os exemplos esdrúxulos que Pelé produziu do ridículo são inúmeros. Vide qualquer uma de suas entrevistas. Os erros de português, absolutamente superiores aos números de gols feitos. As excursões dignas de misericórdia na música. Os milhares de filhos reconhecidos e os que ainda estão por vir. E o brasileiro ainda estufa o peito para menosprezar Maradona, maior concorrente no futebol de décadas atrás (já se vão quantos anos, mesmo?!) e que não merece enaltecimento algum, diga-se de passagem, mas não brinda os argentinos com pérolas da ignorância popular. Os vícios são uma lástima. Mas, nossa maior droga, ainda é o próprio Edson Arantes.
Mamonas Assassinas: a irreverente banda, sucesso dos anos 90, produziu um único disco. Ponto. Não preciso escrever mais nada. O acidente tornou-os mártires. Sem causa ou ideologia. Leitores admiradores dos comediantes musicais possivelmente me desprezam neste momento, mas lembre-se que a lista trata de uma valorização extrema. Sem dúvida, as letras e melodias criadas por Dinho e Cia são de importância ímpar. Irônico, eu?! Imagina.
Paulo Coelho: o popularesco escritor de romances piegas disfarçados de auto-ajuda... Opa. Sem mais comentários.
Augusto Cury: reveja comentário acima acerca do pai do alquimista.
Numa sociedade sedenta por novos heróis e incapaz de produzi-los, talvez seja válido desmitificar certas lendas. As lendas, diferentemente dos mitos, são moldadas com o tempo e formulam-se a partir da imaginação do povo. Aparentemente os questionáveis dados fornecidos pelo governo que traz o pobre menos pobre e a classe média abraçando mais da metade da população brasileira, são verdadeiros. A massa passou a frequentar o cinema, ou pelo menos a comprar o dvd pirata para assistí-lo no aparelho comprado a prazo nas Casas Bahia. E adoram o que vêem. Se não fosse assim, estariam rindo da própria desgraça. Ou sou eu, imaginando?!
Vive-se um momento do favelado heróico. As referências supramencionadas são tão menores que o Capitão Nascimento ou o Zé Pequeno. Nada mais coerente. Corre pelos corredores da Cidade de Deus, que Gal está planejando uma aparição na seqüência do filme de Fernando Meirelles. Ele se recusa a pagar o cachê. Personagens para o Pelé não faltam. O roteiro será de Paulo Coelho e o argumento final de Cury. Sucesso absoluto. Em breve, na feira mais próxima de você. Os extras estarão recheados. Até o menino Josué, de Central do Brasil, tece depoimentos arrematadores.
Pensando melhor, talvez os “mamonas” tenham alguma importância. Afinal, no Brasil, melhor rir do que chorar.
E na sua lista, quem seriam os eleitos?!
Texto por Diego Ponce de Leon